quinta-feira, 30 de abril de 2009

Em vez de plágio, pesquisa: institucionalização de grupos de pesquisa na Educação Básica ajuda a prevenir crimes contra a autoria

É curioso, mas aquelas que são consideradas normalmente as duas disciplinas mais importantes — Língua Portuguesa e Matemática — nunca (ou raramente) são objetos de pesquisa na escola (BAGNO, Marcos. Pesquisa na Escola: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2003, p. 65).


A criação e a institucionalização de grupos de pesquisa no âmbito da Educação Básica justificam-se por quatro razões primordiais. A primeira centra-se na questão de se exaltar a relevância da pesquisa científica que prima pela investigação feita com o intuito expresso de se obter conhecimento específico sobre determinado assunto. No entanto, grande parte dos estudantes não é preparada para tal empreendimento, justamente pela carência de professores interessados em pesquisa, no Ensino Médio e Fundamental. Por isso, em vez de pesquisar, quando são solicitadas tarefas que envolvem investigação aprofundada sobre um tema, muitos alunos (e por que não os próprios professores?) copiam integralmente trechos de Internet, enciclopédias, livros, revistas e jornais, sem critérios metodológicos, agindo como reprodutores acríticos de textos, às vezes, sem se dar o trabalho de ler o que simplesmente plagiaram.



Por conseguinte, pelo menos nessa perspectiva, não há avanço intelectual, e a produção de conhecimento não se efetiva de forma a fazer com que o aluno se sinta autor da construção do próprio saber. Gera-se um círculo vicioso no qual o professor finge que ensina a pesquisar, e o aluno, numa ingenuidade sabotadora, finge que pesquisa. O resultado disso é a apatia ao invés de interesse pelo conhecimento, o qual seria decisivo para a formação de cidadãos capazes de enfrentar as arraigadas desigualdades sociais e as incertezas de uma boa colocação no competitivo mercado de trabalho. Então, é necessário disponibilizar um espaço de discussão capaz de nutrir o gosto pela verdadeira pesquisa, o que pode ser muito estimulante no processo de sedução do aluno para o conhecimento.



Levando-se em conta que a pesquisa criteriosa, pelo menos em termos de linguagem, é mais comumente realizada no Ensino Superior, as vantagens de se difundir esse tipo de investigação em um ambiente basilar de ensino concentram-se no lançamento de fundamentos sólidos para a edificação de um espírito honesto, crítico e dinâmico no trato com o conhecimento. Se esse perfil é consolidado, contribui-se realmente para um valioso processo de transformação social, aquele em que o aluno, de paciente, torna-se agente de sua história intelectual.



Preconceito de linguagem - Tais aspectos servem de base para a segunda justificativa: o aluno que se envolve com pesquisas de linguagem, por exemplo, colabora para a desconstrução do preconceito lingüístico. Considerando-se os trabalhos do lingüista Marcos Bagno, sabe-se hoje que as críticas pejorativas a quem fala “errado” escondem uma discriminação social avassaladora de uma suposta elite contra a maioria que, em boa parte dos casos, não teve a oportunidade de freqüentar a escola. Como os alunos de ensino público são, em geral, de classes socialmente desprivilegiadas, a pesquisa na escola se faz necessária no sentido de provar para os próprios alunos que eles não falam errado e que eles não são piores porque utilizam uma língua distante das Gramáticas Tradicionais. Falar diferente não significa falar errado.



Uma das prioridades desse tipo de investigação é conscientizar os falantes de Língua Portuguesa que eles são capazes de produzir uma linguagem que atenda às suas necessidades comunicativas de modo eficiente. Cabe ressaltar que a variante "culta" também deve ser respeitada, mas tanto quanto aquelas que são atualmente marginalizadas. Como afirmam muitos lingüistas, é importante tornar o aluno um poliglota em sua própria língua, ou seja, fazer com que ele reconheça e respeite os vários registros diferentes no Português Brasileiro e em qualquer língua, independentemente de juízo de valor.



No entanto, a consciência contra a discriminação lingüística e social não basta. Há uma terceira justificativa para a pesquisa no Ensino Básico. Além de desconstruir tabus relacionados à linguagem, a criação de grupos de pesquisa nas escolas tem como objetivo estimular o exercício da elaboração de hipóteses científicas que sustentariam, por exemplo, tais variações lingüísticas. Às vezes, isso parece inviável, mas o professor pode fazer com que o aluno deduza a existência de variantes de linguagem bem como suas regularidades próprias. Fazer o aluno inferir é mediar a construção do conhecimento com eficiência. A partir da tomada de consciência de questões como essas, esse aluno se sentiria mais autorizado a transitar em ambiente sociais variados, adequando-se com grande propriedade às situações comunicativas que lhe são impostas.



É notória a necessidade de se preencher uma lacuna existente no Ensino Básico: a pesquisa com rigor científico evidentemente adaptada à clientela. Por que as agências de fomento destinam a maioria de seus recursos ao nível superior de ensino? Justificar a importância da fundação de um grupo institucional de pesquisa é justificar oficialmente a relevância da produção de conhecimento para a sociedade. Além de constituir um pioneirismo para qualquer município em termos nacionais, legitimar um grupo de pesquisa voltado para investigação científica em nível de Educação Básica é remover antecipadamente barreiras sociais e psicológicas que detêm o avanço do cidadão transformador e crítico.



Prevenção do plágio - Por último, o estímulo à pesquisa no Ensino Médio e Fundamental é uma forma de prevenir, com boa margem de antecipação, o plágio intelectual, infelizmente comum em todos os níveis de ensino, especialmente no Superior. Antes de ser considerado ilícito, o ato de apresentar como próprio um trabalho de outra pessoa nasce muito por conta da insegurança dos alunos, causada pelas lacunas de aprendizagem ao longo da carreira escolar. O estudante que sempre cultuou a pesquisa dificilmente precisaria pagar um ghost writer (escritor-fantasma) ou simplesmente plagiar textos por conta própria para cumprir suas tarefas acadêmicas. Se o valor da pesquisa for disseminado já nos primeiros anos de ensino, a escola que plagia passaria à escola que pesquisa, ou seja, que aposta no perfil crítico de aluno.


Eu e Adriana

Um comentário:

  1. de acordo, em gênero e número. tenho pelejado com os alunos, na tarefa hercúlea do estágio, discutindo sobre a importância da pesquisa e, fundamentalmente, sobre a qualidade da pesquisa nos ensinos fundamental e médio. a escolha do objeto, a proposição de questões, as novas (e velhas tb) tecnologias como instrumento, como ferramenta e não como fim.

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